RODA VIVA
"..a gente quer ter voz ativa, no nosso destino mandar, mas eis que chega a roda viva e carrega o destino pra lá.” ( Chico Buarque- Roda Viva)
Paul Gauguin - Woman in the waves
Quando ouvi pela primeira vez Roda Viva, a música, mais que a letra, provocou-me um sentimento estranho, uma inquietação profunda. Quase que não gostei dela. No entanto, ela sempre encontrou ressonância em cada parte de mim.
A melodia evocava um movimento intenso, visceral, concentrado no esforço em seguir um curso determinado e a percepção de que este curso era inexoravelmente desviado por algo mais forte. Uma rebeldia inata tratava os sentimentos percebidos como um duelo, sim, duelo entre a determinação de alguém contra uma outra força maior, além, terrível e poderosa em sua grandeza.
De um lado a paixão, prerrogativa do humano, singular, específica, direcionada. De outro, a impessoalidade do incontrolável, a abrangência do incognoscível, de tudo que está neste além.
É claro que, na época, eu achava que só havia duas soluções possíveis para este duelo. Uma, a resignação ou o abandono - morte dos sonhos e projetos - que, se não me matava, deixar-me-ia não viva, o que não faria tanta diferença, afinal.
A outra seria a luta, a rebeldia, o não conformismo. Mantém-se a pessoa viva, sem dúvida, mas sempre em guarda, machucando-se a todo instante.
Já há algum tempo, venho percebendo outras opções, nenhuma melhor que a outra, em princípio, e por isso, nenhuma única e constante. Dependendo das minhas forças, dependendo da força das circunstâncias, de minha capacidade de perceber mais ou menos claramente tudo isso, resigno-me, luto, negocio, espero, procuro outra coisa.
Vem, então, uma associação imediata com o mar, presença permanente em minha vida. Meu pai ensinando-me a boiar nas águas mansas da ilha do Governador e a contar as ondas, a sair e entrar no mar agitado de Copacabana. Os amigos, um namorado, mais ousados e com mais intimidade, a me mostrar o verde mais profundo das correntezas no mar aberto da Barra da Tijuca, os rodamoinhos a evitar. A usar a força da correnteza a meu favor, não seguindo em linha reta em direção à praia, mas em diagonal, alternando minha força e a da água, para chegar onde queria, à praia, mesmo que não fosse exatamente ao ponto de onde saí.
O fato é que não há muita escolha em relação à roda viva (originalmente digitei roda vida, ato falho mais que preciso) no que trata de controle ou não. Usar nossa voz ativa para mandar no próprio destino é gastar vela com mau defunto, como diria minha avó.
A voz ativa talvez seja melhor usada no modo se trata a roda vida, roda viva da vida.
Se escolho tratá-la como amiga ou inimiga, se consinto entrar nela e usufruir da experiência ou permaneço ao largo, tentando me apoderar dos controles, observando outros em seus altos e baixos, aparentemente ilesa, irremediavelmente condenada a uma visão única e rasteira.
O mar, de novo, evoca o medo e a alegria em buscar uma onda, em nadar além do quebra mar, esperar aquela mais forte, a mais inteira, a força da água a engolfar o corpo, a perda de controle desdenhada pelo prazer da entrega, o gozo de chegar, mesmo arranhada ou aos trambolhões, ou engolindo água. Triunfantemente viva. Na roda viva.
Paul Gauguin - Woman in the waves
Quando ouvi pela primeira vez Roda Viva, a música, mais que a letra, provocou-me um sentimento estranho, uma inquietação profunda. Quase que não gostei dela. No entanto, ela sempre encontrou ressonância em cada parte de mim.
A melodia evocava um movimento intenso, visceral, concentrado no esforço em seguir um curso determinado e a percepção de que este curso era inexoravelmente desviado por algo mais forte. Uma rebeldia inata tratava os sentimentos percebidos como um duelo, sim, duelo entre a determinação de alguém contra uma outra força maior, além, terrível e poderosa em sua grandeza.
De um lado a paixão, prerrogativa do humano, singular, específica, direcionada. De outro, a impessoalidade do incontrolável, a abrangência do incognoscível, de tudo que está neste além.
É claro que, na época, eu achava que só havia duas soluções possíveis para este duelo. Uma, a resignação ou o abandono - morte dos sonhos e projetos - que, se não me matava, deixar-me-ia não viva, o que não faria tanta diferença, afinal.
A outra seria a luta, a rebeldia, o não conformismo. Mantém-se a pessoa viva, sem dúvida, mas sempre em guarda, machucando-se a todo instante.
Já há algum tempo, venho percebendo outras opções, nenhuma melhor que a outra, em princípio, e por isso, nenhuma única e constante. Dependendo das minhas forças, dependendo da força das circunstâncias, de minha capacidade de perceber mais ou menos claramente tudo isso, resigno-me, luto, negocio, espero, procuro outra coisa.
Vem, então, uma associação imediata com o mar, presença permanente em minha vida. Meu pai ensinando-me a boiar nas águas mansas da ilha do Governador e a contar as ondas, a sair e entrar no mar agitado de Copacabana. Os amigos, um namorado, mais ousados e com mais intimidade, a me mostrar o verde mais profundo das correntezas no mar aberto da Barra da Tijuca, os rodamoinhos a evitar. A usar a força da correnteza a meu favor, não seguindo em linha reta em direção à praia, mas em diagonal, alternando minha força e a da água, para chegar onde queria, à praia, mesmo que não fosse exatamente ao ponto de onde saí.
O fato é que não há muita escolha em relação à roda viva (originalmente digitei roda vida, ato falho mais que preciso) no que trata de controle ou não. Usar nossa voz ativa para mandar no próprio destino é gastar vela com mau defunto, como diria minha avó.
A voz ativa talvez seja melhor usada no modo se trata a roda vida, roda viva da vida.
Se escolho tratá-la como amiga ou inimiga, se consinto entrar nela e usufruir da experiência ou permaneço ao largo, tentando me apoderar dos controles, observando outros em seus altos e baixos, aparentemente ilesa, irremediavelmente condenada a uma visão única e rasteira.
O mar, de novo, evoca o medo e a alegria em buscar uma onda, em nadar além do quebra mar, esperar aquela mais forte, a mais inteira, a força da água a engolfar o corpo, a perda de controle desdenhada pelo prazer da entrega, o gozo de chegar, mesmo arranhada ou aos trambolhões, ou engolindo água. Triunfantemente viva. Na roda viva.
1 Comments:
Já tinha saudades da blogosfera e do Clube das Almas Inquietas.
Bises
CC
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