Clube das Almas Inquietas

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sexta-feira, outubro 08, 2004

Lisboa revisitada

Há um ano atrás, acordei muito cedo numa fria manhã de outubro.
Uma cidade estranha, nenhum conhecido, apenas uma possibilidade de encontro com uma companheira virtual e 24 horas para uma visita brevíssima à terra de meus antepassados.
Lisboa.
Linda, desconhecida, convidava-me a ser descoberta, convite aceito num gesto de coragem inusitado em uma medrosa profissional, temerosa, mais que tudo, do desamparo e da falta de referências.
A viagem, um repente. Bendito repente.
Passava pouco das sete quando sai à rua de calçadas largas, vazias, e uma leve neblina. Passeei a ermo até o Jardim Botânico. Lá, um táxi, tão disponível quanto eu, como que me aguardava. Nada de city-tours ou visitas guiadas. Queria vagar pela cidade, deixar-me levar por ela, acreditando que meus genes, minha herança e a língua partilhada seriam suficientes a me sustentar neste primeiro gesto de total independência.
Pedi ao motorista que me levasse pela cidade, gosto dele, apontando-me o que mais apreciava. Gentil e hospitaleiro, meu anfitrião não pareceu estranhar o pedido, comprometendo-se a conduzir “a menina” (ganhei o dia!) a pontos estupendos de sua cidade, tão bela.
Alfama, a Baixa, o Rossio, nomes melodiosos, casarios de azulejos, ladeiras e mais ladeiras anunciavam a setes colinas da cidade, como aprendi. Meus olhos quase que reconheciam o que nunca vira, tamanho o meu encanto.
Castelos me fascinam. Nascida numa terra jovem, meus castelos sempre foram de sonho e devaneio. Eu os busco, na terra antiga, para poder dizer: Sim, existem e finalmente neles eu estou. Mal cheguei ao Castelo de São Jorge, dispensei o carro e o condutor. Afinal, mil anos me chamavam.
Apenas eu e um outro casal dividíamos o espaço dentro das muralhas. Num acordo tácito, seguimos um para cada lado, usufruindo, possessivos e egoístas, da posse silenciosa das histórias sussurradas pelas pedras.
Lisboa a meus pés, o Tejo ao fundo, e eu, por um momento, além do tempo e do espaço.

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