Clube das Almas Inquietas

Bem vindo todo aquele que quer mais do que o cotidiano pode oferecer

sexta-feira, novembro 25, 2005

8 MINUTOS


Mais cinco metros, o barco e a superfície. O que dizia o manual?

Fiquei tempo demais, quantos minutos para descompressão, quantos minutos me separam de viver ou morrer, oito, nove, dez minutos, o manual dizia, não se afaste do companheiro, não desça mais do que ele, o manual dizia, ia perder aquele peixão, ganhar pontos, o campeonato, não vou morrer, calma, perdi o controle, perdi o tempo, não vou perder a vida.
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Não pesco mais. Só mergulho, me chame de maluco. Os peixes, eles me salvaram naquele dia, lembra? Lá, no desespero, tentava lembrar de quantos minutos de descompressão eu precisava. Os peixes se aproximaram e nadaram 8 minutos a minha volta. Era o que precisava. 8 minutos.

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quarta-feira, novembro 23, 2005

Um encontro desencontrado

Quinta feira. Noite de chuva e blues, um bar charmoso, freqüentadores de mais de trinta anos. Duas amigas se encontram.Uma delas recém terminou um relacionamento longo, esquecida de como ser solteira. A outra, descolada, experiente, oferece colo e incentivo à nova solitária da praça. Alguns whiskies, muita conversa, papos, confidências. Descontração.
-Viu o Andy Garcia ali atrás?
-Onde ? onde?
-Ali, atrás de você, não para de te olhar.
-Ali? Atrás?

Bia olha para trás sem a menor sutileza.
-Humm,gostei.
-Mexe na bolsa.

Bia obedece, murmurando entredentes:
-Ele tá olhando.
-Vá ao banheiro.
-Mas eu acabei de ir!Vai parecer que eu tenho cistite!
-Então vai no bar.
-Mas, à troco de quê? Vai dar muita bandeira.

O celular da Bia resolve o impasse.O barulho da banda é enorme, ela precisa sair da mesa para poder ouvir. Vai até o banheiro. Na saída,
-Oi...
-Oi.
( sorri , sem graça)
-Achei seu sorriso lindo.
-Obrigada.(
Mais sem graça ainda, mas gostando, claro)
-Queria conhecer vc melhor.
-Nem sei o que dizer..
.( neurônios se congelam diante da progesterona?)
-Me diz o número do telefone.
-9995-5999 (Que cara decidido, bárbaro!)
Bia sorri.
-Qual é seu nome?
-Luis. O seu?
-Bia.
-A gente podia almoçar, conversar um pouco.Estou com uns amigos de trabalho aqui.Eu ligo amanhã, ai podemos conversar com calma.

Bia é recebida na mesa por uma Alice animadérrima.
-Menina! Grandes possibilidades!!!
-Pô, Alice, Calma. De repente é uma gelada. O cara não liga,ou se liga vai que é um serial killer. Estou cansada de ouvir estas histórias.
-Deixa de ser boba, você tá é com medo, o que tem a perder?
-Bem, é verdade. Nada, né? Nessa altura do campeonato...

Pouco depois, Bia e Alice vão embora. Assim que Bia chega em casa, o celular toca.
-Alô.
-Oi, é o Luis. Quis te ligar ainda hoje. Eu achei seu sorriso lindo, falei com você, pedi seu telefone e estou ligando hoje.
-Que surpresa! Já saiu do bar?
-É, estou saindo, eu achei seu sorriso lindo, queria te conhecer melhor, a gente podia sair, mas... fala, fala alguma coisa de você.
-Fala? O que?
-Eu achei seu sorriso lindo, falei com você, pedi seu telefone e estou ligando hoje....

A mesma frase? De novo?
Silêncio.
-Fala, anda.. não vai falar? Fala, fala alguma coisa...
Bia pensa em voz alta: Sit! Rola! Finge de morto!
-Você trabalha em quê?
-Prá que que você quer saber?
-Ora, você disse para eu falar, trabalho é assunto neutro. Mas, se você prefere a gente fala do tempo. Ainda está chovendo?

A resposta veio contrafeita:
-É, tá. Eu trabalho no Bradesco. E você? Trabalha com o quê?
-Sou psicóloga.
-Já sei.Sai por aí interpretando todo mundo,querendo descobrir as coisas. Sou normal, tá ouvindo?
-Estou,não se preocupe. Só interpreto quem me pede e me paga.
-Você é casada?
-Não. E você?
-Por que você quer saber?
-Pelo mesmo motivo que você me perguntou, ora.
-Ah, é. Sou. Mas isso não é problema pra mim.
-Bem, pode ser um problema prá mim. Imagine, não vou poder te ligar com liberdade, não vou poder encontrar com gente conhecida sua, zero fins de semana, não poder tomar água de coco e andar de mão dada na praia...

Luís interrompe Bia.
-Sabe, você fala demais e isso que você disse é uma idiotice. Se não tem problema prá mim, como vai ter problema prá você?.E,eu estive pensando. Não sei... (suspense na voz) Acho que não vou te ligar amanhã.
-Luis, eu acho que você acabou de ter uma grande idéia! Boa noite.

PS_ O relato não é ficcional. Sem créditos ou deméritos para o diálogo apresentado.

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segunda-feira, novembro 21, 2005

ALI, DO OUTRO LADO


O rio estendia-se ao infinito. As águas turvas e caudalosas proibiam qualquer tentativa de vadeá-lo à pé e o homem percebeu que de pouco valeria persistir em margeá-lo. A saída para o trabalho e o assalto a poucas quadras do escritório, quanto tempo antes não sabia, misturavam-se em imagens borradas. Seqüestro?
A cabeça latejante e o corpo dormente o faziam suspeitar de pancada ou queda.


Junto ao rio escuro, a mente parece encontrar um foco: o velho sentado, meio adormecido, num pequeno barco amarrado a um arbusto à beira d´água.
- Senhor, que rio é este? Como faço para atravessar?
-Se tiver duas moedas, eu o levo até o outro lado.
O homem revolve os bolsos achando, enfim, as moedas. Com um único remo longo, o velho orienta a embarcação em direção à margem contrária.
Após algum tempo, o homem repete a pergunta:
- Que rio é este?
- Não sabe onde está?
-Não. Que rio é este?
- O Estiges.

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